Somos mesmo produto do meio como se afirma tão facilmente no senso comum, pouco afeito a questionamentos interiores e exteriores? Na verdade, o “sim, senhor”, o “a vida é assim mesmo”, o “sempre foi assim” são expressões corriqueiras que podem nos dar uma pista na direção a favor do resultado da equação:
meio + influências = produto.
Quero concentrar-me aqui no aspecto sociológico da reflexão, que inclui o lado psicológico também, da sociabilidade que estabelecemos a partir do momento que desgarramos para a estrada, a ter a nossa existência garantida por nossos próprios recursos materiais. Não quero falar se me tornei um mecânico, depois um historiador, um cozinheiro e escritor por influência do meio em que vivi anteriormente. O que me fascina observar é o que sou no dia a dia, meus medos, minhas apreensões, minha audácia, minha bondade, meu índice de maldade, minha indiferença, a minha solidariedade, minha capacidade de doar-me, minhas angústias, meus remorsos, minhas dores, minhas alegrias, minhas tantas idiossincrasias, esta palavra que finalmente é a síntese que mais me aproxima de um auto retrato.
Se ajo assim ou assado diante de uma circunstância é por causa do efeito que o uso de meu livre arbítrio gerou para julgar a minha capacidade de resolver as coisas que se apresentam em minha vida. Não, senhoras e senhores, não é a perfeição. Aqui entram as intempestividades, os arroubos, as ações que podem, num primeiro momento, ser consideradas desequilibradas. Mas o meu jeito de ser e levar a vida vai corrigir ou não mais à frente o que fiz. Ou na hora mesmo em que as coisas aconteceram, posto que estamos falando de relações humanas e então haverá sempre uma reação do outro lado.
As tais qualidades de caráter mais significativas tem sim, tudo a ver com um acumulado de essências que transitaram em nós, por nós e para nós em algum momento do passado. Desvios? Há. Tanto os provenientes de nossas escolhas, quanto da falta de capacidade de discernimentos. Há também um mundo de oportunidades não disponíveis e há um mundo de oportunidades desprezadas. Isso faz muitíssima diferença quando se chega a uma certa idade ou a um grau de amadurecimento e a gente para, a fim de fazer umas confabulâncias interiores.
Fico pensando no tanto que “puxei” pelo lado de minha mãe e de meu pai, do tanto que alguns tios me ensinaram e outros que me deram mal exemplo pra caramba! O tanto que as professoras de minha infância foram importantes na minha formação. Meu amigos todos os que passaram por mim e os que permaneceram, bem como os que hoje me chegam. Meus relacionamentos afetivos, o tanto que aprendi com a paternidade e se tenho ensinado. Isso com olhos de agora, de lá da galha alta da árvore, esse fruto “de vez” (aquele que está com potencial para amadurecer) que em algum momento vai ter cumprido o seu ciclo.
O tempo com sua inclemência avassaladora é nosso aliado ou algoz de acordo com o alcance que a nossa vista vai atingindo com esta tal maturidade de que falo e busco tanto. Quero não ter que me preocupar com o processo de envelhecimento de minhas células. Não se o processo me garantir vitalidade física e mental. A física, em forma de boa saúde. E a mental , se se mantiver nesse fino equilíbrio entre a sanidade e a loucura transformadora, já estará bom demais.
Reinventarmos o meio é a maior prova de que amadurecemos. Bem ou mal vamos modificando o produto. Se amadurecemos bem, aprimoramos. Se amadurecemos mal ou não amadurecemos, vamos vivendo feito isso que somos considerados em última instância: mercadoria descartável, peça de reposição neste gigantesco mecanismo humano de quase sete bilhões de componentes.
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